sábado, abril 19

Virgínia Quaresma: pioneira, negra, lésbica e jornalista — resistência ontem e hoje

Por Carolina Rosa 

No dia 7 de abril, quando celebramos o Dia do Jornalista no Brasil, é urgente lembrar que a história da imprensa também é feita de resistência — especialmente quando olhamos para corpos que sempre estiveram à margem. Uma dessas figuras é Virgínia Quaresma, considerada a primeira jornalista negra do Brasil. Nascida em Portugal, em 1882, e radicada no Brasil, Virgínia desafiou todas as expectativas de seu tempo: era mulher, negra, lésbica e jornalista em uma sociedade que negava espaço e voz a quem ousava ser tudo isso ao mesmo tempo.

Virgínia não apenas abriu caminhos como mulher na imprensa — profissão que, até hoje, segue majoritariamente ocupada por homens brancos —, mas também assumiu publicamente sua orientação sexual em uma época marcada pela repressão. Atuou em grandes jornais, cobriu casos policiais de repercussão nacional e foi também uma militante pelos direitos das mulheres. Sua trajetória é um lembrete poderoso de que o jornalismo sempre foi um campo de disputa — por narrativas, por representatividade e por justiça social.

Mas o que de fato mudou de lá para cá? 

Mais de um século depois, jornalistas negras e LGBTQIAPN+ ainda enfrentam os mesmos mecanismos de exclusão e violência. A perseguição, agora, também se veste de virtual: ameaças, ataques coordenados, discursos de ódio nas redes sociais. Uma jornalista negra, hoje, ao expor injustiças ou contrariar interesses poderosos, ainda corre risco. Ainda é alvo e precisa se defender para  exercer sua profissão. A liberdade de imprensa continua sendo uma conquista cotidiana — frágil, vigiada e, muitas vezes, solitária.

Seguindo o legado de Virgínia, outras mulheres deixaram sua marca no campo da escrita, da comunicação e da resistência intelectual:

Nísia Floresta, considerada uma das primeiras feministas brasileiras, já no século XIX escrevia artigos defendendo os direitos das mulheres, a educação feminina e o fim da escravidão. Em tempos em que mulheres sequer podiam votar, ela usava a palavra como ato político.

Antonieta de Barros, educadora, jornalista e primeira mulher negra eleita deputada no Brasil, fundou o jornal A Semana, em Santa Catarina, onde escrevia sobre educação, igualdade racial e a importância da alfabetização como ferramenta de emancipação.

Eneida de Moraes, jornalista, escritora e militante comunista, foi presa durante a ditadura Vargas por suas atividades políticas. Sua produção jornalística era intensa e engajada, sempre voltada para os direitos das mulheres, dos trabalhadores e pela liberdade de expressão.

Glória Maria, pioneira no telejornalismo, foi a primeira repórter negra a ganhar projeção nacional na televisão brasileira. Com sua voz firme e seu olhar sensível, rompeu barreiras raciais em um dos meios mais excludentes: a TV. Fez do microfone uma ferramenta de conexão com o mundo e com o Brasil profundo, sempre com coragem e elegância.

Rachel de Queiroz, embora mais conhecida como romancista, também foi jornalista e cronista. Foi a primeira mulher a entrar para a Academia Brasileira de Letras, levando consigo a força da escrita feminina nordestina e uma crítica social afiada que atravessou décadas.

Celebrar o Dia do Jornalista é também reconhecer essas trajetórias insurgentes que desafiaram — e continuam desafiando — o silenciamento. É lembrar que, enquanto houver uma mulher negra e lésbica escrevendo, investigando, falando, resistindo — o jornalismo estará vivo. Que a memória de Virgínia Quaresma e de tantas outras que escreveram com o corpo e com a alma continue sendo farol para uma imprensa mais plural, mais humana e, sobretudo, mais justa.

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