sábado, setembro 21

Marginalização da imagem periférica no cinema 

Filme “Cidade de Deus” foi lançado em 2002 – Foto: Divulgação

O que merece e não merece ser visto pela sociedade e pela verdade encoberta pelo sensacionalismo? As periferias e favelas são retratados pela mídia tradicional como lugares marginalizados, reforçando o imaginário popular de quem não está no dia a dia destes locais, como se houvesse apenas tráfico de drogas, violência, prostituição e pessoas pobres, que não batalharam o suficiente para ter uma vida que merecem. 

Vou te mostrar como o cinema ajudou com que esses estereótipos sobre a periferia seguissem sendo perpetuados, por anos após anos, dentro do imaginário dos brasileiros e do resto do mundo. 

Com mais de 56 milhões de brasileiros vivendo nas periferias urbanas, onde suas histórias não são contadas pelos próprios, mas sim por pessoas que as contratam, o cinema é uns dos tipos de comunicação mais influentes, que pode mudar a opinião de um país inteiro sobre um determinado assunto, em um estalar de dedos, é uma grande arma de propagação cultural e social.

O objetivo dessa sétima arte é representar o real de várias formas, ou não tão reais assim, e quando você é o alvo dessas más interpretações cobertas de estereótipos, onde ganham rios de dinheiro com a supervalorização da violência, das periferias, marginalizando ainda mais esses locais e dos moradores de modo generalizado. 

Quando falamos de periferias sempre lembramos de um lugar sujo, pobre e violento, onde indivíduos, normalmente nordestinos e pretos, vivem à margem da sociedade lutando pelo pão de cada dia. Obras como Cidade de Deus e Tropa de Elite, enfatizam isso mesmo.  Até com uma boa representação dos moradores do local, com um elenco que inclui pessoas da própria comunidade como em Cidade de Deus, ainda, sim, reforçam o estereótipo de violência da cidade do Rio de Janeiro. 

Mesmo se passando no Rio de Janeiro e não em uma periferia de São Paulo, vejo muitas similaridades entre as retratações.

Em 1996 a imprensa tradicional brasileira apelidou os distritos do Capão Redondo, Jardim Ângela e Jardim São Luiz de “Triângulo da morte”. A ONU (organizações das Nações Unidas) declarou o Jardim Ângela o bairro mais perigoso do mundo, por cauda da maior taxa de homicídios por 100 mil habitantes de todo o mundo. Com isso não vejo muita diferença entre a história do filme Cidade de Deus e a realidade da época nessa região de São Paulo.

O sensacionalismo é um combustível que chama atenção do público, que tem sua atenção acordada pela porradaria que existe em filmes que utilizam as periferias, comunidades, favelas como cenário, colocando como se esses lugares mais pobres fossem extremamente brutais e sem humanidade. Muitas vezes, sem dizer uma palavra, apenas induzindo nosso subconsciente a entender que tudo que está dentro deste lugar deve ser rejeitado, principalmente, os moradores que em sua maioria são trabalhadores tentando dar um futuro melhor às suas famílias. Lembrando que muitos desses filmes retratam a violência de forma grotesca e exagerada, tanto pela escolha de fotografia mais “suja”, pela angulação de câmera mais fria, roteiro mais padrão, figurinos sujos de sangue, as expressões dos atores e o comportamento dos seus personagens, passam esse estereótipo.

Esses estereótipos estão tão impregnados na nossa sociedade que até os mesmo aqueles que são objetos desse olhar, reforçam a narrativa de pessoas marginalizadas e violentas, como o cinema e outras mídias tentam passar. Essa imagem pré-estabelecida é repassada há anos pelos mesmos veículos, que querem exatamente reforçar esse imaginário, esses vínculos não estão inseridos nessas realidades, internalizando a mensagem passada. Os telespectadores absorvem o que é transmitido por essas mídias, influenciando direta ou indiretamente na opinião pública.

Entretanto, com o passar dos anos essas representações estão cada vez menos presentes no cinema, sem as caricaturas ultrapassadas, pois com a chegada e acesso dos produtores de audiovisual periféricos na cultura e, principalmente, no cinema, tem finalmente colocado os protagonistas das próprias histórias e vivências nessas produções, colocando de forma apropriada a verdade desses locais. Existem vários coletivos que lutam pelo cinema mais democrático, como lugares como o Bloco do Beco, Fábricas de Cultura, Casas de Cultura entre outros que têm projetos de cinema feito por pessoas periféricas. Que sejam cada vez mais!

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Meii

Estudante de 18 anos, cursando o seu último ano do Ensino Médio, é apaixonada por artes desde criança. Nasceu e cresceu no Capão Redondo, atualmente é estudante de música, cenografia, moda e audiovisual focado no cinema. Também tem um podcast chamado Click Colagem, onde analisa obras artísticas com outros convidados. 

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